sábado, 1 de agosto de 2015

Influência africana na literatura brasileira


A presença da cultura africana na nossa própria é incontestável e podemos percebê-la em vários meandros. Na literatura não é diferente. Podemos perceber a apropriação de vocábulos essencialmente africanos e construções típicas, principalmente na poesia, por homens brancos, sem descendência alguma, que o fizeram pelo puro aprecio. 
Exploraremos essa questão através de um caso pontuado, mas representativo – o de Jorge de Lima.

♦ Jorge de Lima (1893 – 1953) 
O poeta valorizava motivos poéticos afro-nordestinos. Seus textos abrigam várias possibilidades de leituras (a convivência entre a tradição e o novo, o vulgar e o sublime, o regional e o universal). Experimentou estilos diversos como o parnasiano, o regional o barroco, o religioso. 
[...] 
Serra da Barriga! 
Barriga da negra-mina!¹ 
As outras montanhas se cobrem de neve, 
De noiva, de nuvem, de verde! 
E tu, de Loanda², de panos-da-costa³, 
De argolas, de contas, de quilombos4!

Serra da Barriga! 
Te vejo da casa em que nasci. 
Que medo danado de negro fujão!

¹ Negra-mina: e mulher do grupo tribal de cultura fantiaxanti, da Costa do Ouro (Guiné); também se diz preto(a)-mina. 
² Loanda ou Luana: vem do quimbundo luanda, significando tributo, que se refere a um antigo tributo anual da época em que a região pertencia ao Congo.

³ Pano-da-costa: tecido de algodão, listrado, originário da África e usado como xale. 
4 Quilombo: termo vulgar desde o século XVII, vem de povoação. Em Angola significa paragem, pouso para descanso das viagens pelo interior. No Brasil adquiriu um sentido diferente, o de lugar que reúne grande número de escravos fugidos. Em Alagoas, designa também folguedo, durante o Natal.

Não somente os vocábulos e maneira de falar determinaram algumas diretrizes na literatura, mas também suas próprias crenças aparecem nos versos, elementos do imaginário negro africano, que foram posteriormente assimilado por nós e que se misturaram a outros já aqui presentes como os mitos do saci e aos caiporas dos nossos índios. 
É o caso de poemas como O Medo:

O BICHO Carrapatu, 
O negro velho de surrão 
- foi o medo que passou.

Mas depois chegou o medo, 
O medo maior que houve 
que as negras velhas contavam: 
era a cabra-cabriola, 
lobisomens, besta-feras.

poemas que falam sobre a familia brasileira como essa negra fulò:

Essa Negra Fulô

Ora, se deu que chegou 
(isso já faz muito tempo) 
no bangüê dum meu avô 
uma negra bonitinha, 
chamada negra Fulô.

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô! 
(Era a fala da Sinhá) 
— Vai forrar a minha cama 
pentear os meus cabelos, 
vem ajudar a tirar 
a minha roupa, Fulô!

Essa negra Fulô!

Essa negrinha Fulô! 
ficou logo pra mucama 
pra vigiar a Sinhá, 
pra engomar pro Sinhô!

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô! 
(Era a fala da Sinhá) 
vem me ajudar, ó Fulô, 
vem abanar o meu corpo 
que eu estou suada, Fulô! 
vem coçar minha coceira, 
vem me catar cafuné, 
vem balançar minha rede, 
vem me contar uma história, 
que eu estou com sono, Fulô!

Essa negra Fulô!

"Era um dia uma princesa 
que vivia num castelo 
que possuía um vestido 
com os peixinhos do mar. 
Entrou na perna dum pato 
saiu na perna dum pinto 
o Rei-Sinhô me mandou 
que vos contasse mais cinco".

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô! 
Vai botar para dormir 
esses meninos, Fulô! 
"minha mãe me penteou 
minha madrasta me enterrou 
pelos figos da figueira 
que o Sabiá beliscou".

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô! 
(Era a fala da Sinhá 
Chamando a negra Fulô!) 
Cadê meu frasco de cheiro 
Que teu Sinhô me mandou? 
— Ah! Foi você que roubou! 
Ah! Foi você que roubou!

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

O Sinhô foi ver a negra 
levar couro do feitor. 
A negra tirou a roupa, 
O Sinhô disse: Fulô! 
(A vista se escureceu 
que nem a negra Fulô).

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô! 
Cadê meu lenço de rendas, 
Cadê meu cinto, meu broche, 
Cadê o meu terço de ouro 
que teu Sinhô me mandou? 
Ah! foi você que roubou! 
Ah! foi você que roubou!

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

O Sinhô foi açoitar 
sozinho a negra Fulô. 
A negra tirou a saia 
e tirou o cabeção, 
de dentro dêle pulou 
nuinha a negra Fulô.

Essa negra Fulô! 
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô! 
Cadê, cadê teu Sinhô 
que Nosso Senhor me mandou? 
Ah! Foi você que roubou, 
foi você, negra fulô?

Essa negra Fulô!


Influência africana na literaturabrasileiraA presença da cultura africana na nossa própria é incontestável e podemos...

Posted by Haykal Aby Muhammad on Sexta, 31 de julho de 2015

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